O poder econômico da inclusão desacreditado pela Academia
- Rafael Bonfim
- 27 de nov. de 2019
- 2 min de leitura
Atualizado: 28 de abr. de 2021

Anos atrás uma aluna do último ano de Administração me procurou para conversar sobre o
seu trabalho de conclusão de curso. Ela teve a ideia de desenvolver o projeto de um bar
completamente preparado para receber pessoas com deficiência e que use desse preparo
como diferencial para atrair a clientela. O projeto foi barrado e impedido de continuar, pelos
seguintes motivos:
- O empreendimento não teria mercado. Pessoas com deficiência não
freqüentam casas noturnas, bares e afins.
- As pessoas com deficiência não dispõem de recursos financeiros para usufruir
desse serviço.
- As pessoas sem deficiência se sentiriam desconfortáveis em um
estabelecimento voltado para deficientes.
Público para o empreendimento existe sim e dinheiro também.
Alguém mais, além de mim e dessa aluna, discordam completamente disso?
O bar iria contar com rampas de acesso, cardápios em braile, um profissional com domínio de
Libras, banheiros adaptados e as mesas seriam dispostas visando a boa circulação de cadeira
de rodas. Era nesse conjunto de medidas que a aluna estava apostando para apresentar um
negócio inovador, requisito pontuado pelo professor orientador.
Além disso, a aluna trabalharia com a norma NBR-9050, da ABNT, que estabelece critérios e
parâmetros técnicos a serem observados quando do projeto, construção, instalação e
adaptação de edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos às condições de
acessibilidade.
É espantoso ver que uma postura como essa está dentro de uma universidade, sendo
transmitida para futuros administradores. Dizer que deficiente não sai. Afirmar que um projeto
que visa inclusão é uma perda de tempo. Reafirmar preconceitos.
Que tal olhar o projeto como algo sim inovador, que visa atender uma clientela ainda não
contemplada? Se a pessoa com deficiência não freqüenta estabelecimentos noturnos, por se
sentir mal acolhida, podemos propor um espaço que mude esse conceito, não podemos?
De acordo com o IBGE 2010, o Brasil tem hoje cerca de 45 milhões de pessoas que apresentam algum tipo de deficiência. Em 2000 esse grupo chegava 24,5 milhões.
O dado mais pontual que eu encontrei em relação ao poder econômico de pessoas com
deficiência veio da Reatech, a segunda maior feira de acessibilidade e reabilitação do mundo,
que acontece anualmente em São Paulo, que traz, por exemplo, inovações do setor de órteses,
próteses e materiais especiais (OPME), que movimenta R$ 20 bilhões anualmente.
Público para o empreendimento existe sim e dinheiro também. Temos bares em diferentes
bairros, para diferentes classes, com diferentes preços. E tem bolso para tudo também.
Desenvolver um bar que fosse modelo em adaptação e atendimento à pessoa com deficiência
tem a ver com cumprimento de normas técnicas, com sustentabilidade (uma vez que ele fala
no pilar social e cultural), apresenta oportunidades legais de marketing e comunicação com o
público e agregaria valor ao bairro e à cidade. É um ótimo exercício e poderia perfeitamente
ser aceito.
Mas não, ao invés disso, o profissional que tem como função fomentar ideias para o futuro foi
conservador e tolheu uma proposta diferente, vinda de uma estudante com vontade de
quebrar um paradigma, de arriscar.
Você, empreendedor, o que achou dessa proposta?
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